"Exmo Sr. Primeiro-Ministro António Costa
Venho, por este meio, pedir a Vossa Excelência que tome conhecimento da delicada situação em que os professores contratados com horário com componente letiva
incompleta se deparam atualmente, face às deliberações provenientes do Ministério da Educação e à falta de vontade política dos grupos parlamentares, nomeadamente do
Partido Socialista (PS), do Partido Social Democrata (PSD) e do CDS-Partido Popular (CDS-PP) em encontrar uma resolução imediata e efetiva desta situação injusta e discriminatória.
Para um melhor entendimento da complexidade desta questão, permita-me transcrever um excerto do artigo de opinião do Sr. Professor Santana Castilho (in Público, 14/11/2018) que resumiu esta matéria da seguinte forma:
“...Tentemos falar do factual, no contexto de um enorme emaranhado de normativos, que facilitam a pulsão kafkiana dos que mandam, no caso em apreço directores
de agrupamentos e Instituto de Gestão Financeira da Educação. Com efeito, para entender de que se trata há que compulsar, pelo menos, entre outros normativos, a Lei n.º 110/2009, que estabelece
o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, o Decreto Regulamentar n.º 1-A/2011, que a regulamenta, e os seis diplomas que, sucessivamente, o foram alterando: Lei nº
64-B/2011, Decreto Regulamentar nº 50/2012, Decreto Regulamentar nº 6/2013, Decreto Regulamentar nº 2/2017, Decreto-Lei nº 93/2017 e Decreto Regulamentar n.º 6/2018. Assim, de perder o fôlego!
O que está em causa é saber se um professor contratado com um horário lectivo incompleto pode ser considerado a tempo
parcial e, por essa via, ver averbados, em sede de Segurança Social, menos do que 30 dias de trabalho em cada mês. E não pode. Com efeito, os professores contratados nesta circunstância são-no ao abrigo de um contrato resolutivo a termo certo e não em sede de contrato a tempo parcial,
sendo que o nº2 do artigo 76º do Estatuto da Carreira Docente reza assim:
“O horário semanal dos docentes integra uma componente lectiva e uma componente não lectiva e desenvolve-se em cinco dias de trabalho”.
Por outro lado, a Lei n.º 7/2009, que reviu o Código do Trabalho, estabelece como segue, nos artigos e números citados: “Artigo 150.º (noção
de trabalho a tempo parcial).
3 - O trabalho a tempo parcial pode ser prestado apenas em alguns dias por semana, por mês ou por ano, devendo o número de dias de trabalho ser estabelecido por
acordo.
Artigo 153.º (forma e conteúdo de contrato de trabalho a tempo parcial).
1 - O contrato de trabalho a tempo parcial está sujeito a forma escrita e deve conter:
b) Indicação do período normal de trabalho diário
e semanal, com referência comparativa a trabalho a tempo completo.
2 - Na falta da indicação referida na alínea b) do número anterior, presume-se que o contrato é celebrado a tempo completo.” Termos em que, no caso dos professores, um horário
lectivo incompleto não pode ser considerado como trabalho a tempo parcial.
O que supra escrevi acompanha, no essencial, a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, produzida a 29 de Maio transacto, na sequência de uma acção
administrativa interposta por um professor. O docente reclamou a contabilização de 30 dias de trabalho em cada mês, para efeitos de prestações à Segurança
Social, durante o decurso do contrato a termo, com horário lectivo incompleto, que havia celebrado com um agrupamento de escolas. O tribunal deu-lhe razão.”
De salientar, ainda, que o grupo parlamentar do PS, representado pela senhora deputada Sónia Fertuzinhos, debateu em sede de Comissão de
Educação e Ciência os projetos de resolução n.º 1778/XIII, do Bloco de Esquerda (BE), n.º 1826/XIII, do Partido Comunista Português (PCP) e n.º 1840/XIII, do
PSD sobre a matéria em questão, e que os mesmos obtiveram voto contra do grupo parlamentar do PS, argumentando que a legislação em vigor dá
resposta a estes casos e, por isso, não apresentando alternativas à situação de profunda injustiça que estes docentes se encontram, contribuindo para que
o problema persista.
Assim, o entendimento do grupo parlamentar do PS e dos juristas do Ministério da Educação (conforme ofício do M.E. de 9/11/2018, referência n.º 1445/2018) é o de que um professor contratado colocado em horário com componente letiva incompleta é um trabalhador a exercer funções a tempo parcial, pelo que não
poderia ver declarados 30 dias de trabalho por cada mês. Mais: para a concretização desses descontos, a fórmula a usar a partir de 2019 deverá ser a seguinte: por cada 5 horas, é declarado
1 dia de trabalho para a Segurança Social.
Ora, torna-se bizarro que a tutela, juntamente com a Segurança Social, acabem por decidir ter um entendimento da situação
destes docentes que a própria legislação efetivamente não define pois, tal como determinou o acórdão do Tribunal Administrativo de Sintra (processo nº218/18.0BESNT), os docentes com horários letivos incompletos não celebram, de facto, contratos a tempo parcial. O que significa que estes docentes têm, direito aos 30 dias por mês de descontos para a Segurança Social. Claramente esse direito não está
a ser respeitado pela tutela nem pelas entidades supracitadas.
Esta posição contradiz mesmo o próprio Estatuto da Carreira Docente relativamente à definição da natureza do serviço docente, dado que, atualmente, estes docentes têm apenas uma parte do seu trabalho contabilizado para efeitos de descontos para a Segurança Social (componente letiva), enquanto a outra parte (componente
não letiva) não é contabilizada, criando uma grave discriminação entre pares.
Saliente-se que esta situação tem repercussões numa eventual situação de desemprego e até para o
cálculo do valor da reforma, uma vez que, apesar de cumprirem um horário semanal de 5 dias de serviço por semana, estes docentes têm visto ser contabilizados menos do que 30 dias por mês para
a Segurança Social, o que os prejudica gravemente no cumprimento dos prazos mínimos para o acesso a estas prestações sociais.
Gostaria, por último, de chamar a atenção para a proposta de aditamento por parte do grupo parlamentar do PCP, em sede de discussão na especialidade do Orçamento
de Estado de 2019 (Proposta de Lei n.º 156/XIII/4.ª), que poderia desbloquear esta situação que afeta, até ao momento, mais de 7700 docentes colocados nesta tipologia de horários neste
ano letivo.
Pode ler-se, na proposta enunciada, o seguinte:
“(...) os docentes não são contratados a tempo parcial, mas sim a termo resolutivo, com um horário incompleto. Ao contrário do que acontece no contrato a tempo parcial, tal não
é alvo de acordo entre as partes, mas sim de aceitação do docente. O mesmo se refere aos dias de trabalho, pois os docentes em horário incompleto estão 22 dias úteis nas escolas, apenas
não têm um horário completo. Esta diferença é refletida no valor da prestação social, como é o caso do subsídio de desemprego, devidamente proporcional com o horário
aceite pelo docente.
A proposta que o PCP apresenta é no sentido de reforçar que aos docentes contratados a termo resolutivo, com horário incompleto,
não se aplicam as normas do Decreto-Regulamentar n.º 1-A/2011, de 3 de janeiro, que se referem aos contratos a tempo parcial (…)”
Deverá Vossa Excelência compreender que a recusa em acompanhar este intento de resolução demonstrará mau dolo,
dado que é urgente acabar com esta situação de precariedade, instabilidade e injustiça que os professores colocados nestes horários têm vindo a sofrer. É mais do que justo que estes docentes vejam contabilizados para a Segurança Social 30 dias por mês, ainda que com remunerações e descontos proporcionais ao
número de horas letivas do seu horário.
Agradeço, assim, que Vossa Excelência possa contribuir com todo e qualquer esforço para a rápida resolução desta questão tão premente,
onde a tutela, instituições e grupos parlamentares continuam a falhar no entendimento."
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarExcelente.
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